O tubo de pasta dental

quarta-feira, 24 de novembro de 2010 17:17 Postado por Divagações, pão e circo




Os primeiros raios de sol anunciam o começo de um novo dia. Faltam quinze para as seis. Laura tinha que se levantar. Precisava pegar duas conduções para chegar ao trabalho. Ela trabalhava como costureira numa confecção.
Como diz a música de Chico, “todo dia ela faz tudo sempre igual”. Ao abrir os olhos, olhava para o marido. Aquele gesto parecia lhe dar a certeza de que valia a pena viver. Seu casamento com Orlando era seu porto seguro.Ele ainda dorme, pois afinal naquele dia só daria aulas à tarde.
A seguir, Laura vai até o banheiro e confere seu rosto, que já começa a ser castigado pelas marcas da passagem de tempo. Observa e arranca os cabelos brancos que encontra. Sabe que em pouco tempo esta será uma luta inglória e inútil. Era necessário trabalhar com a idéia de que estava envelhecendo e isto era público e notório. Tinha acabado de completar 40 anos. Meu Deus, 40 anos!!!
Só naquele momento se deu conta de que chegara à metade da vida. Ao se preparar para escovar os dentes, notara que o tubo de pasta dental estava pelo meio. A sua vida poderia, a seu ver, ser comparada àquele tubo. Um dia, tudo terminaria. Ela não precisaria nem poderia comprar outro.
Uma conclusão atormentara sua mente: a de que não queria fazer da outra metade de sua existência o que fizera com a primeira. Tudo bem,construíra uma família feliz. Era importante para ela, mas passou a não ser tudo.
Laura sentiu uma sede de viver, de experimentar, de tentar ser realmente feliz. Estava entusiasmada com a sua descoberta. Era engraçado como encarava a vida a partir de agora. Não sentia vontade de voltar ao trabalho. Emprego estava difícil, mas encontraria algo que a realizaria. Não se mataria mais num emprego que a dava pouco retorno financeiro e nenhuma felicidade.
Colocou um belo vestido. Fez a mala. Se despediu de cada canto da casa. Talvez, nunca mais teria a oportunidade de estar ali. Foi ver os filhos. Sorriu para o marido, que ainda dormia, pela última vez. Deixou uma carta explicando tudo.Esperava que Orlando entendesse.
Era o fim. Ou o começo. Um recomeço. Poderia ir para a casa da tia. Tinha como opção “tomar um chá de sumiço”. Pensaria nisso lá fora, na rua. Bateu a porta, pegou o elevador e ganhou a calçada.

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